Notícia - COMO MAX OLIVEIRA CRIOU A MAXMILHAS SEM A AJUDA DE INVESTIMENTOS EXTERNOS
 Pequenas Empresas & Grandes Negócio Publicou uma notícia no dia:30/01/19 11:48:08

COMO MAX OLIVEIRA CRIOU A MAXMILHAS SEM A AJUDA DE INVESTIMENTOS EXTERNOS


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uando criança, Max Oliveira, 33 anos, sonhava em ser jogador de futebol, ou vocalista de uma banda de rock. Nascido em Coronel Fabriciano, interior de Minas Gerais, fazia de tudo para impressionar a família.

Ganhava competições esportivas, tirava notas altas, escrevia canções emocionadas. Até que, em 2013, descobriu sua verdadeira vocação, ao fundar a MaxMilhas.

Modelo único de negócio no mundo, a startup revolucionou o mercado de passagens aéreas ao oferecer a possibilidade de comprar e vender milhas de outros usuários.

Hoje, contabiliza 1,5 milhão de passagens emitidas, mais de 20 bilhões de milhas negociadas e um faturamento que cresce 300% ao ano, em média. E tudo isso sem um único aporte.

Qual foi sua motivação para empreender?
Teve um fato marcante na minha infância que influenciou muito a minha decisão de me tornar empreendedor. Minha mãe me teve muito nova, aos 18 anos. Não foi uma gravidez planejada, ela não queria ter filhos na época.

Acabou tendo de casar por causa disso. Então eu fui um problema para ela nos primeiros anos. Ser fruto de uma gravidez indesejada gerou uma insegurança e uma carência muito fortes. Acho que minha reação foi sempre fazer muitas coisas, talvez para provar ao mundo que fazia sentido eu estar aqui.

Eu faço terapia há muitos anos, então hoje tudo isso está resolvido. Mas, quando decidi empreender e fundar a MaxMihas, também queria justificar minha existência nesse planeta. Não estava pensando em dinheiro, e sim no meu propósito: ajudar as pessoas a viajar.

Abrir um negócio sempre esteve no seu horizonte?
Na verdade, o que eu queria mesmo era ser um jogador de futebol. Por conta da minha vontade de me provar, sempre fui muito bom em esportes, ganhava todas as competições em que entrava.

Então sonhava em ser um jogador profissional. Mais tarde, na adolescência, me apaixonei pelo Legião Urbana e decidi ter uma banda. Era desafinado, mas tinha um certo jeito para a composição. Escrevia letras sobre os meus conflitos maternos, e sobre os namoros da adolescência. E aí sonhava em ser músico.

Deixei tudo isso de lado quando fui fazer intercâmbio nos Estados Unidos, aos 16 anos. Foi ideia do meu padrasto, com quem minha mãe se casou quando eu tinha 10 anos. O curioso é que minha mãe, dona de uma loja de moda feminina, não tinha condições de comprar a passagem. Daí um tio meu, que tinha milhas, emitiu o bilhete para mim.

Essa história parece boa demais para ser verdade.
É verdade, eu juro. Estou escrevendo um livro sobre a história da empresa, que deve ser lançado em 2019. Relembrando o passado, percebi que o empreendedorismo nunca acontece de um dia para o outro, “vou criar um negócio e pronto”. São vários fatos que vão se encadeando ao longo da vida.

Mas você só consegue ligar os pontos depois. Fui cursar engenharia de produção em Belo Horizonte por influência de um tio meu. Eu era ótimo em matemática e física, então adorei o curso. Já formado, virei trainee da Ambev e, depois, da Vale, onde fiquei três anos. Lá, participei de um projeto para implantar o conceito lean na Vale, com consultoria da Toyota. Aprendi muito sobre empresas enxutas. E foi durante minha temporada na Vale que tive a ideia para a MaxMilhas.

A história é famosa: você foi comprar uma passagem para encontrar a namorada, estava muito cara, buscou o preço em milhas. É isso mesmo?
Foi um pouco mais complicado. Tive um problema no processo da compra, e o preço da passagem Vitória-São Paulo foi de R$ 100 para R$ 500. Eu até tinha os R$ 500, mas era pão-duro, não quis gastar.

Estava com saudade da namorada, mas não tanto assim! Bom, fiquei indignado com aquilo e comecei a refletir sobre como comprar passagem era uma coisa complicada no Brasil. Aí pensei, muita gente tem milhas. E se eu ligasse para algum amigo que pudesse me vender as milhas dele?

Mas vi que não seria prático. O ideal é que existisse um site onde eu pudesse comprar milhas... Comecei a falar com outras pessoas sobre isso, e elas acharam interessante. Conversei com o Conrado Abreu, filho do meu padrasto, e ele topou ajudar. Mas no começo era apenas um hobby.

Quando assumiu o negócio?
Eu só ia lá de noite e nos fins de semana. Até que tirei férias e fiquei um mês inteiro dedicado ao negócio. Adorei aquilo. Percebi que estava acomodado na Vale. E que, se continuasse lá, ia perder a capacidade de sonhar. Sei que parece um clichê, daqueles que as pessoas acham bonitinho, mas não é não.

Na verdade, decidi empreender porque queria ter um reconhecimento maior. Era aquela velha carência materna batendo ali. Então criei uma empresa com propósito, mas não porque eu era altruísta.

Queria mudar o mundo porque, no fundo, isso me alimentava. Desde o início, o objetivo não era ganhar dinheiro com as milhas, como faziam os outros negócios: queríamos fazer as pessoas viajarem mais. Por isso, criamos uma plataforma para conectar quem quer vender e comprar.

Desenvolvemos uma solução tecnológica complexa, um buscador que encontra passagens aéreas nas companhias em dinheiro e em milhas. Em julho de 2013, seis meses depois de colocar o site no ar, pedi demissão. No mês seguinte, recuperei os R$ 28 mil que haviam sido investidos na empresa. E não paramos mais de crescer.

Uma das particularidades da MaxMilhas é ter alcançado o crescimento sem jamais recorrer a investidores externos. Isso foi uma escolha?
É engraçado, todo mundo assume que eu não quis falar com os fundos, comentam como fui inteligente, estratégico etc. Mas a verdade é que não consegui que ninguém investisse na empresa! [risos].

Tudo bem que esse nunca foi o meu foco principal. Fui mais reativo: se alguém demonstrava interesse, eu conversava. Quando participei do Startup Brasil, em 2014, vários fundos vieram conversar com a gente.

Mas eles diziam que o modelo de negócio era muito arriscado, porque não tinha nenhuma referência, ninguém estava fazendo lá fora. Porque, quando você está no Brasil, quando você é latino, tudo tem de ter referência. Teve até gente que gostou dos fundadores, mas queria que a gente mudasse de negócio. Hoje muita gente se arrepende, porque a empresa cresceu exponencialmente, mesmo sem aportes.

Você se diz um defensor do bootstrapping. Na sua opinião, o empreendedor brasileiro busca aportes muito rápido?
Sim, esse é um erro comum. É preciso saber o momento certo de falar com os fundos. Antes, existe um período de aprendizado, você tem de descobrir se existe o market fit, aprender o que o consumidor quer, como o negócio funciona operacionalmente. Tem gente que começa muito rápido.

Mal começou o negócio e já vende 30% da empresa. Diz que não consegue fazer nada sem dinheiro. Cara, quando eu comecei, não tinha dinheiro. Então, sempre dá para começar, a não ser que seja uma ideia supertecnológica. Acredito que cada empreendedor deve seguir o máximo de tempo possível com recursos próprios. Para alguns, o máximo é seis semanas, para outros é seis anos.

E para a MaxMilhas, qual é o máximo?
Não sei ainda. Para mim, o momento certo é quando você percebe que é o dinheiro de fato que vai fazer a diferença. E até hoje não estou 100% certo disso. Será que nosso negócio suporta um retorno de longo prazo, de dois anos, por exemplo, em um mercado que muda tanto?

Veja bem, o David Vélez, do Nubank, levantou milhões de dólares logo no início da operação e hoje está aí, gigante. Eu tive de adaptar minha operação para os recursos que eu tinha. E deu certo também. Então são duas visões interessantes.

Você quer se tornar um unicórnio, como o Nubank?
É meu objetivo? Não. Mas eu acharia superlegal virar um unicórnio, lógico. No meu caso, vejo mais como consequência do que como meta. Sempre quis ter um negócio grande, que democratizasse as viagens no país e mudasse a vida de muita gente. Esse propósito me alimenta. Se esse crescimento todo transformar a empresa em um unicórnio, legal. Uma vez eu li um artigo sobre o que era necessário para se tornar uma empresa de US$ 1 bilhão. Leva em média sete anos.

Até o segundo ano, você tem de faturar uns US$ 2 milhões. Nos cinco anos seguintes, precisa tripicar, triplicar, duplicar, duplicar e duplicar. A gente demorou dois anos pra chegar em alguns poucos milhões de reais. Depois, quadruplicou em 2015, quadruplicou em 2016 e triplicou em 2017. Agora tem de triplicar em 2019. Então podemos chegar lá. [A empresa não revela o faturamento atual.] Mas quem faz a valuation são os fundos. Então vamos ter de negociar com eles primeiro. Pode ser que isso aconteça em 2019.

O que pretende fazer com os recursos levantados?
Acho que a MaxMilhas teria um bom fit na América Latina. Um fundo poderia ajudar a fazer essa expansão internacional de maneira mais rápida. Também estamos desenvolvendo novos produtos dentro da empresa.

Queremos criar outras plataformas, talvez um app, ou vender no WhatsApp. E negociar com companhias internacionais, para vender mais passagens para o exterior. Outro plano é comprar outras empresas que lidam com milhas. Estamos conversando com algumas agora.

Com a MaxMilhas, vocês transformaram o mercado de passagens aéreas. No processo, conseguiram irritar muita gente, especialmente as companhias de aviação. Como está essa relação agora?
Hoje somos muito próximos de algumas companhias aéreas. Mas não de todas. Tento cultivar um bom relacionamento, mas nem sempre elas estão dispostas a ouvir o que a gente tem a dizer.

Sempre me preocupei em fazer um negócio que agregasse valor para as companhias aéreas, até porque nós dependemos delas para o negócio funcionar. A MaxMilhas foca no consumidor que é sensível a preço. 96% das pessoas que viajam conosco não comprariam a passagem caso fosse mais cara. Então eu acredito que geramos valor. É como se fôssemos um outro canal de distribuição das companhias aéreas, com preços mais acessíveis. Mas não é um canal legitimado por elas.

As empresas aéreas alegam que vender milhas iria contra as regras dos programas de fidelidade.
Existem cláusulas nos contratos de fidelidade dizendo que não pode vender. Mas não há nenhuma legislação sobre isso. Na minha visão, não dá para dizer ao consumidor que ele não pode vender milhas, sendo que aquilo teve um custo, não foi de graça.

Antigamente, você viajava e ganhava as milhas, então não percebia que estava pagando. Mas hoje, com a parceria entre programas e cartões de crédito, quem quer ter milhas paga anuidade mais cara. Você pode entrar no site do programa e comprar milhas. Nenhuma lei vai dizer que o consumidor não pode revender o que comprou.

Max Oliveira, 33 anos, da MaxMilhas em viagem com a mãe, Martha (Foto: Arquivo pessoal)
O empreendedor  Max Oliveira, da MaxMilhas, com o sócio, Conrado Abreu (Foto: Arquivo Pessoal)
O escritório atual da empresa MaxMilhas, com 280 funcionários (Foto: Arquivo pessoal)

Outra queixa é que colocariam em risco os dados dos usuários, já que pedem a senha do programa de fidelidade.
Nunca tivemos nenhum problema com segurança de dados. Mas é um risco que tratamos com muita seriedade. Para proteger o usuário, terceirizamos toda a estrutura de segurança de dados.

Seria melhor para nós não precisar pegar a senha dos usuários para emitir as passagens. Mas, com o crescimento do negócio, isso ficou impossível. Uma opção seria fazer um sistema integrado com as companhias aéreas. Mas essa conversa é bem difícil.

Os programas de fidelidade, que haviam se tornado independentes, estão voltando a fazer parte das companhias aéreas. Como esse movimento afeta a MaxMilhas?
Dependendo das novas regras que as companhias vão criar, pode ser que o volume de emissões que a gente pode fazer com as milhas seja limitado.

Então é uma ameaça, sim. O que acontece é que as companhias aéreas sempre trabalharam com o caixa bem apertado. Daí, viram nas empresas de fidelidade uma oportunidade para gerar recursos. A TAM fez isso com o Multiplus, a Gol com o Smiles. E, como os programas eram muito lucrativos, ajudavam as empresas — em 2016, o Smiles antecipou R$ 1 bilhão para a Gol, que precisava de caixa.

O problema é que os programas cresceram demais. E as companhias aéreas começaram a questionar até que ponto isso era bom para elas. A Latam foi a primeira a fazer esse movimento, reincorporando o Multiplus. E a Gol já avisou que vai fazer a mesma coisa. Agora é esperar para ver os resultados.

Qual a sua principal ambição?
Queremos ser a melhor plataforma para pesquisa e compra de passagens da América Latina.

E não estamos falando só de milhas. Hoje somos, acima de tudo, um site de pesquisa e compra, seja qual for o método de pagamento. A intenção é sermos os melhores em relacionamento com o cliente, focando em serviço e experiência. Agora, pessoalmente, o que me deixa mais feliz é ver os depoimentos de gente que não viajaria se não fosse pela nossa plataforma.

Uma história que me emociona muito é a de um rapaz de Foz do Iguaçu que queria ir a Brasília ver o pai, que sofria com um câncer em estado terminal. Era feriado e estava tudo caro, só conseguiu ir porque encontrou um preço bom com a gente. Um dia depois da visita, o pai faleceu. Mas, com a nossa ajuda, ele conseguiu dizer adeus. Cara, fico até emocionado contando isso.

Max Oliveira, 33 anos, trabalhou na Ambev e na Vale antes de fundar a MaxMilhas, em 2013.  (Foto: Marcus Desimoni / NITRO)