Notícia - STONE: O UNICÓRNIO BRASILEIRO QUE CHAMOU A ATENÇÃO DE WARREN BUFFETT
 26/02/19 10:39:26

STONE: O UNICÓRNIO BRASILEIRO QUE CHAMOU A ATENÇÃO DE WARREN BUFFETT


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Essa história de empreendedorismo se tornou possível graças a três grupos de parceiros: nossos clientes, que são a razão de nossa existência; nossos investidores, que nos apoiaram e acreditaram em nossos sonhos e visão desde o princípio; e nosso jovem e apaixonado time de empreendedores, que estão transformando o panorama brasileiro dos pequenos negócios, com sua energia incansável.”

Assim começa a carta de apresentação da Stone, assinada pelos seus fundadores: os cariocas Andre Street, de 34 anos, e Eduardo Pontes, de 39. O texto foi registrado na Securities and Exchange Commission (SEC), autoridade do mercado de capitais dos Estados Unidos, como parte dos trâmites para a oferta inicial de ações (IPO) da empresa.

No fim de outubro, a processadora de pagamentos, fundada em 2012 e conhecida pelas maquininhas verdes de cartão de crédito, lançou seus títulos na Nasdaq. Conseguiu levantar US$ 1,5 bilhão — o valor mais alto obtido por uma empresa brasileira desde 2013 —, e alcançou um valor de mercado de cerca de US$ 9 bilhões. É um fenômeno tão raro que existe um adjetivo para as poucas startups no mundo avaliadas em mais de US$ 1 bilhão: unicórnio. Após o IPO, a Stone passou a ter entre seus sócios a nata do capitalismo mundial.

A Stone, de Andre Street e Eduardo Pontes, ousou entrar no setor de pagamentos de cartão. (Foto: ilustrações: Marcus Penna)

São nomes como Berkshire Hathaway, administradora de investimentos do megainvestidor Warren Buffett; Ant Financial, subsidiária de pagamentos da gigante de e-commerce chinesa Alibaba; Madrone Capital Partners, fundo de investimentos que cuida da fortuna dos herdeiros do Walmart, colosso americano do varejo; além dos brasileiros Jorge Paulo Lemann, Marcel Telles e Carlos Alberto Sicupira, da 3G Capital — gestora da Ambev e do Burger King.

A carta dos fundadores sugere que a aposta desses megacapitalistas na Stone é também uma aposta no potencial dos pequenos negócios no Brasil. O sucesso da empresa, afinal, depende do sucesso do setor.

Andre Street é grato aos cerca de 9 milhões de pequenos e médios empreendedores do Brasil. Em nome dessa gratidão, respondeu a 20 perguntas de Pequenas Empresas & Grandes Negócios. “Esta é a primeira entrevista que dou na vida”, diz Street, nas páginas seguintes.

“Os leitores da revista são a força motriz deste país.” Informal dentro de sua empresa — a ponto de circular de bermuda e pedir opiniões aos funcionários, nos corredores —, Andre é avesso à exposição pública. Recusou nosso pedido de fotografia. Aceitou apenas divulgar sua equipe — e suas ideias.

Aparentemente novo, aos 34 anos, Andre Street é na verdade um jovem veterano. Seu bisavô, o médico Jorge Street (1863-1939), foi um empresário pioneiro na tecelagem brasileira e um dos fundadores do Centro das Indústrias de São Paulo (Ciesp).

Ainda na escola, aos 15, Andre fundou sua primeira empresa de pagamentos — a Paga Fácil, vendida em 2004, quando cursava a faculdade de Direito. Em parceria com Eduardo Pontes, criou também a Braspag, vendida ao Grupo Silvio Santos em 2009 e hoje parte da Cielo.

A carta de apresentação da Stone traz três aprendizados, úteis tanto para os investidores estrangeiros como para empreendedores brasileiros: 

• “O Brasil é um país maduro com oportunidades. Não apenas por sua grande população e economia em desenvolvimento, mas também por causa da presença relativamente fraca de pagamentos eletrônicos e de tecnologia simples e amigável para ajudar o comércio moderno e estimular o empreendedorismo brasileiro”.

• “Num mercado como o nosso, é importante estar muito bem afinado com o ambiente regulatório. Nos esforçamos em entender novas regras de uma perspectiva técnica. Muitas de nossas decisões foram guiadas pelo nosso entendimento da estrutura de mercado do Brasil e pelos rumos do ambiente regulatório, a fim de beneficiar a sociedade e aumentar a competitividade.”

• “A terceira e mais importante lição que aprendemos, desde os primeiros dias, foi que a concentração e a tradição no mercado criaram uma lacuna nas ofertas disponíveis para os comerciantes, tanto em termos de tecnologia quanto em atendimento ao cliente. Esse contexto criou uma oportunidade de construir uma empresa centrada em torno das necessidades dos comerciantes, e de equipá-los para impulsionar uma transformação que apenas a tecnologia poderia proporcionar.”

Os fundadores da Stone dizem que a receita do sucesso da empresa — que, em menos de seis anos de atividade, conseguiu mais de 230 mil clientes e 5,5% do mercado de pagamentos — é o foco no consumidor. “Queríamos que nossos clientes tivessem um serviço agradável e prazerosamente surpreendente — em vez de apenas aceitável”, diz a carta.

“Estávamos apaixonadamente focados na ideia da centralidade do cliente — a lógica principal do que fazemos precisa estar voltada a melhorar a experiência do consumidor.” Este é um princípio importado de outros setores. O texto cita explicitamente o exemplo da Zappos, a rede de varejo online ligada à Amazon, famosa por satisfazer os consumidores mesmo quando isso não envolve a venda de seus produtos. Segundo a dupla Andre Street e Eduardo Pontes, o atendimento da Stone apoia-se em três pilares:

• Tecnologia: reduzir a necessidade de perder tempo com assistência, ao criar um serviço de autoatendimento simples e intuitivo;

• Conexão humana: qualificar atendentes para entender o cliente e resolver problemas;

• Proximidade: manter-se perto do cliente é a única forma de entender as suas necessidades.
Seguir os aprendizados e pilares da Stone pode não ser uma garantia de sucesso. Mas ignorá-los é, seguramente, um atalho para o fracasso.

Andre Street, cofundador da Stone (Foto: Divulgação )

Você e os diretores da Stone sempre foram muito discretos. Por quê?
Nós historicamente temos muito pouca interação com a mídia. Raramente nosso time dá entrevistas. É a primeira entrevista que dou na vida. Fizemos isso porque entendemos que a PEGN tem uma imensa contribuição social ao informar e educar o pequeno e médio empreendedor brasileiro, que carece de veículos para estudar. Os pequenos empreendedores, leitores da revista, são a força motriz deste país. São responsáveis por 38 milhões de empregos, mais da metade das vagas da iniciativa privada.

Qual é a sua identificação com o pequeno empresário?
Nós mesmos, no início de nossas carreiras como empresários, fomos bastante influenciados pela PEGN. Me lembro de sair para comprar a revista toda vez que uma nova edição era lançada. Sempre lemos a publicação, desde que éramos bem jovens. Temos uma identificação muito grande com nosso cliente. Ele é um pequeno empreendedor brasileiro, como a gente. Normalmente é um comerciante, um dono de negócio que precisa receber pagamentos e controlar seu fluxo de caixa com bastante precisão. Ele precisa de soluções eficientes, transparentes e de um suporte que realmente se importe com a resolução do problema dele até o fim. Esse empresário não pode perder tempo.

Como o empreendedorismo no Brasil se compara ao de outros países?
Tenho notado uma grande evolução dos empreendedores brasileiros. Tenho visto também grandes investidores começarem a entrar em cena para apostar no Brasil. Se isso continuar evoluindo, vamos ter uma economia mais saudável e mais produtiva, o que retroalimenta o processo empreendedor e beneficia a todos. Alguns setores estão em um ponto de inflexão nunca visto, permitindo o crescimento de novas iniciativas e empresários que trazem o DNA do “novo Brasil”, com mais ética nos negócios e mais tecnologia. O novo empresário tem uma mentalidade de propósito: em vez de empreender puramente pelo dinheiro, está disposto a resolver problemas que gerem impacto relevante para a sociedade.

Você sempre quis empreender ou a vida o levou para esse caminho?
Eu faço o que faço desde que me entendo por gente... Aos 13 anos, tentei exportar açaí, cachaça e guaraná natural. Obviamente, eu não consegui, mas segui inventando. Aos 15, fiz a primeira empresa de verdade. Daí comecei. Sempre busquei oportunidades. Eu e meu sócio vemos oportunidade em tudo, curtimos isso. Mesmo em coisas que não estão boas na empresa, normalmente paramos e gostamos de discutir com os responsáveis: da adversidade nasce a oportunidade. Empreender é solucionar problemas. É preciso criatividade e depois persistência para entender um problema e desenvolver, em detalhes, a solução.

É verdade que você era mau aluno no colégio, mas, antes de terminar a faculdade, já havia vendido uma empresa por meio milhão de reais? Empreendedor precisa de escola?
Eu sempre estudei bastante os assuntos que me interessavam, mas, como uma mente inquieta, a escola convencional era muito difícil para mim. Muito novo, eu já sabia o que queria e qual seria minha profissão. Seguindo minha intuição e o incentivo do padrasto de um grande amigo meu, comecei a ler livros de negócios. Li centenas de livros na minha adolescência e esse hábito me ajudou. Não é só em sala de aula que se aprende. A formação pode vir da curiosidade sobre o funcionamento das empresas, de buscar entender como elas funcionam e estudar histórias de times que deram certo. Pode vir do interesse genuíno por pessoas mais inteligentes ou complementares.

A Stone, de Andre Street e Eduardo Pontes, ousou entrar no setor de pagamentos de cartão. (Foto: ilustrações: Marcus Penna)

Como você aprimora seu conhecimento?
Na verdade, o hábito de estudar e aprender tem de ser eterno. Eu e Eduardo [Eduardo Pontes, o Edu, cofundador da Stone] sempre tivemos 30% do nosso tempo investido em nos preparar para a próxima fase de cada negócio. Isso exige duas coisas: curiosidade e disciplina. Esses elementos são parte da nossa cultura na Stone e serão cada vez mais importantes para esta nova fase da companhia.

O que é preciso ter em mente ao começar um novo negócio?
Em primeiro lugar, antes de pensar em você, é fundamental pensar na solução que você está dando para o seu cliente. Vejo muita gente abrindo negócio para mostrar para os outros, ou simplesmente para ganhar dinheiro. É claro que ganhar dinheiro é importante, mas a jornada normalmente é longa e suada. Não dá para fazer bem feito sem ter uma causa e alguém para você impactar.

Você não recomenda fazer startups pensando em vendê-las depois. Por que é importante não pensar na saída?
Se você começar pensando em vender, vai se distrair do foco principal, que é resolver a dor de alguém e criar um sistema de administração que perenize o negócio.

Quando é hora de pensar em vender?
Depois de a empresa gerar valor por algum tempo e se tornar capaz de remunerar bem as pessoas que a administram. Nessa hora, é possível constatar que um outro dono seria melhor para o negócio. Com base em nossa experiência de ter feito isso algumas vezes, este ciclo não leva menos do que cinco anos. Apesar de possível, não acho necessário vender ou pensar em vender. Gosto mais de quem não pensa nisso.

Como manter-se motivado à frente de um negócio?
Você deve acordar todo dia disposto a transformar a vida das pessoas com a sua empresa. Esse pensamento vai tornar a jornada mais prazerosa para você e para sua família, vai ajudar a atrair gente boa para a equipe e vai levar você mais longe. Quem serve a uma causa normalmente vai mais longe. A consequência disso será, entre outras coisas, ganhar dinheiro.

Muitos empreendedores reclamam da burocracia no Brasil.
Acho que o empreendedor não se vitimiza, em nenhuma hipótese. A burocracia é enorme, sim, mas temos duas alternativas: ser parte do problema ou parte da solução. Nós nos decidimos pela segunda. Ao tomar essa decisão, é natural incorrer em custos dessa burocracia, mas recomendo fortemente que nada disso seja uma desculpa para não pagar impostos ou não cumprir as regras do jogo. Todos os setores têm exemplos de quem opera direitinho e ganha dinheiro. É preciso se preparar, entender o setor e eventualmente ser criativo para fugir de algumas “burocras”, mas sempre dentro das quatro linhas. Alguns ramos são melhores que outros. A escolha é também importante, mas sempre dá para fazer direito.

Já passou pela sua cabeça desistir?
Desistir nunca passou pela nossa cabeça. Mas para isso é importante conviver com pessoas de qualidade para ajudar a solucionar as adversidades e se inspirar diariamente. Mas é ainda mais importante amar o que se faz. Ter objetivos audaciosos e concretos ajuda a espantar esses pensamentos negativos...

Como você conseguiu formar uma equipe de alto nível?
Eu sempre gostei de ter sócio. Gosto de gente de verdade e me interesso por pessoas, em qualquer estágio da carreira, que tenham feito algo de interessante. Nós todos aqui adoramos trazer para perto pessoas que julgamos serem complementares ou melhores do que nós mesmos. Fazer isso de forma sistemática, ao longo de alguns anos, cria um time bastante forte. São essas pessoas que desafiam você e acabam cobrindo seus defeitos. Talvez isso tenha começado quando eu era muito novo e realmente não tinha ninguém pior do que eu... Desde então virou um mantra que nos ajuda a crescer até hoje, na Stone. É parte do nosso objetivo de vida de melhoria contínua da nossa empresa, que funciona totalmente em função do nosso cliente.

Vocês são conhecidos por contratar muitas pessoas. Como atrair gente boa e manter a equipe motivada?
Procuramos pessoas que tenham três elementos, que são indissociáveis: inteligência, integridade e energia. Gostamos de investir nos jovens e potencializá-los, mas é fundamental encontrarmos esses três ingredientes. Quando recrutamos, não ficamos nos vendendo — até porque a vida aqui não é fácil e não nos achamos bons o suficiente para motivar ninguém. A motivação vem de cada um e vem de dentro. Nosso trabalho é identificar as pessoas que veem motivo no que fazemos e que querem fazer disso o motivo delas. Em seguida, é preciso dar desafios à altura desses jovens e guiá-los. À medida que eles têm sucesso, temos de ser justos, ao dividir o valor que eles criaram e incentivá-los com ações da companhia ao longo do tempo. Assim, também alinhamos os interesses. Quando fazemos isso, ganhamos sócios. As pessoas que vêm trabalhar com a gente vão fazer suas vidas com as próprias pernas e vão empurrar essa companhia para a próxima fase. Elas têm de ter uma energia brutal para perseverar e inteligência para criar soluções para os problemas, além de uma integridade inquestionável para fazer a empresa durar.

Você nunca gostou de se comportar como um CEO clássico e é conhecido pelo estilo informal. Por que age assim?
Eu não sou CEO porque o Thiago Piau [atual ocupante do cargo] é muito mais competente do que eu e Eduardo. Nenhum de nós dois quis ser CEO de nada. Se eventualmente um dia assinamos algum documento com este título, foi porque julgamos que naquele momento não tínhamos um candidato pronto. Esta função requer uma reponsabilidade imensa, principalmente após a abertura de capital na bolsa, nos EUA. Achamos que a empresa tem de funcionar sem a gente. Isso nos abre tempo para estudar, para ajudar algumas áreas que precisam se desenvolver mais rapidamente e para procurar oportunidades para a Stone que queremos ter daqui a alguns anos.

A Stone foi criada quando já existiam players consolidados. O que levou você a crer que havia espaço no mercado?
Há mais de 20 anos, os lojistas brasileiros eram servidos de forma não adequada, e pagavam muito caro por isso. Muitos deles não tinham a transparência desejada em relação ao fluxo de caixa de suas transações com cartão de crédito. Além do mais, as empresas que controlavam o mercado, em um regime de exclusividade com as bandeiras de cartão, eram subsidiárias de grandes bancos. Esses bancos têm outros interesses no relacionamento com os lojistas. Eles misturam as estações, tornando difícil entender o preço de cada produto.

Como a Stone buscou se diferenciar no mercado de pagamentos?
Percebemos que, com uma tecnologia muito mais moderna e um atendimento muito humano e empático, além de uma distribuição local nas pequenas cidades do Brasil, poderíamos oferecer um serviço bem melhor e mais barato. Queremos facilitar a vida desse comerciante, que já tem tantos obstáculos para empreender e tocar seu negócio. Isso nos motiva a fazer cada dia mais e melhor.

A Stone não foi sua primeira empresa no mercado de pagamentos [as duas anteriores foram vendidas para a Cielo e para um banco, respectivamente]. Por que ela deu tão certo?
No caso da Stone, nós já tínhamos alguma experiência nas nossas empresas anteriores. Vimos a oportunidade na época da Braspag, vendida posteriormente para a Cielo, na década passada, mas ainda era muito cedo para entrar nisso, por conta da estrutura do mercado da época. O mercado só permitiu a entrada de players independentes de bancos em 2010, quando o Banco Central e o Cade promoveram as mudanças necessárias para viabilizar a competição aberta no segmento. A Stone nasce apenas em 2012.

Qual deve ser o papel do governo no estímulo ao empreendedorismo?
Não somos fãs de incentivos financeiros vindos do governo para empreendedores. O bom empreendedor vai se virar e arrumar o capital inicial... Se nós fizemos, qualquer um pode fazer. Basta assegurar um terreno igual para os melhores poderem vencer em suas áreas de atuação, sejam quem forem, venham de onde vierem. É importante combater iniciativas de empresas que buscam criar regras para inibir a competição. Fomentar o empreendedorismo vale a pena, porque isso normalmente se traduz em competitividade e produtividade para todos os setores da economia. O solo precisa estar fértil e nosso governo precisa empenhar esforço nessa causa.

Como você quer ser conhecido nos próximos 30 anos?
Adoraria que o Edu respondesse esta pergunta. Ele diria: “eu e o Andre não queremos ser conhecidos”. Bem, por isso que sou eu que estou falando... Eu aprimoraria esta frase dele ao afirmar que nosso objetivo é criar uma companhia que seja conhecida pelos feitos do nosso time. Queremos que a companhia seja conhecida por transformar a indústria de meios de pagamento no Brasil em algo mais justo e eficiente para os lojistas. Queremos que a Stone seja uma grande empresa brasileira que sirva de exemplo de qualidade de serviço e que melhore a vida de milhões de empresas que usarão suas soluções. Torcemos e trabalhamos para, daqui a 30 anos, ter um time que não sossega. Para ter um país mais competitivo e produtivo, cheio de gente que faz acontecer.