Notícia - Idioma "perdido" é decodificado em tábuas que seriam como Pedra da Roseta
 Galileu Publicou uma notícia no dia:2023-02-06 18:01:15

Idioma "perdido" é decodificado em tábuas que seriam como Pedra da Roseta


Imagem: David I. Owen


Por Redação Galileu

Uma língua “perdida” do povo amorreu, que partiu de Canaã e fundou um reino na Mesopotâmia, foi decodificada em duas tabuletas de argila de cerca de 4 mil anos. As pedras trazem frases ao lado de traduções na língua acadiana, que podem ser lidas por estudiosos modernos.


A descoberta foi registrada por uma dupla de pesquisadores em 2022 na revista Revue d'assyriologie et d'archéologie orientale. Os autores são Manfred Krebernik, professor na Universidade de Jena, na Alemanha, e Andrew R. George, docente emérito de literatura babilônica na Escola de Estudos Orientais e Africanos da Universidade de Londres.


Por trazerem mais de um idioma, as tábuas lembram a Pedra da Roseta, um famoso artefato encontrado na cidade egípcia de Roseta, próxima a Alexandria, pelo exército de Napoleão em 1799. A pedra do Egito contém uma mensagem em uma língua conhecida (o grego antigo), em paralelo com duas escritas desconhecidas da antiga escrita egípcia (hieróglifos e demótico).


As tabuletas do Iraque foram descobertas há cerca de 30 anos, possivelmente durante a Guerra Irã-Iraque, de 1980 a 1988. Mais tarde, os objetos foram incluídos em uma coleção nos Estados Unidos. Mas não se sabe se as tábuas foram levadas legalmente do Iraque e pouco se conhecia sobre elas.


"Nosso conhecimento do [idioma] amorreu era tão lamentável que alguns especialistas duvidaram que tal linguagem existisse", contaram os autores da nova pesquisa ao site Live Science por e-mail. "As tabuletas resolvem essa questão mostrando que a linguagem é articulada de maneira coerente e previsível e totalmente distinta do acadiano", dizem eles.

Krebernik e George começaram a estudar as inscrições em 2016. Uma análise de gramática e vocabulário da língua misteriosa mostrou que o idioma era da família das línguas semíticas ocidentais, que também inclui o hebraico (hoje falado em Israel) e o aramaico, antes mais difundido, porém atualmente usado só em algumas comunidades dispersas no Oriente Médio.


Tabuletas de quase 4 mil anos contém língua cananeia perdida  — Foto: Rudolph Mayr/Cortesia Rosen Collection

Tabuletas de quase 4 mil anos contém língua cananeia perdida — Foto: Rudolph Mayr/Cortesia Rosen Collection


A dupla de pesquisadores notou semelhanças entre a língua enigmática e o pouco que se sabe sobre os amorreus, concluindo que as tábuas trazem frases desse povo. Segundo eles relataram ao Live Science, as tábuas contêm não apenas novas palavras, mas também frases completas, exibindo vocabulário e gramática novos.

As inscrições podem ser de autoria de um escriba ou aprendiz de escriba babilônico que falava acadiano, como um "exercício improvisado nascido da curiosidade intelectual", acrescentaram os autores.


Além disso, tudo indica que as tabuletas eram uma espécie de "guia turístico" para os antigos falantes acadianos que precisavam aprender o amorreu, conforme contou Yoram Cohen, professor associado de Assiriologia da Universidade de Tel Aviv, em Israel, que não esteve envolvido na pesquisa. Por exemplo, há uma lista de deuses amorreus que os compara com os deuses mesopotâmicos correspondentes. Já outra passagem detalha frases de boas-vindas.

Mas havia um pouco de tudo, segundo Cohen. "Há frases sobre preparar uma refeição comum, sobre fazer um sacrifício, sobre abençoar um rei", disse ele. "Existe até o que pode ser uma canção de amor… Ela realmente abrange toda a esfera da vida”.


Embora a escrita hebraica mais antiga conhecida seja de cerca de mil anos depois, muitas das frases das tabuletas são semelhantes ao hebraico, como "derrame-nos vinho" ("ia -a -a -nam si -qí-ni -a -ti" em amorreu e "yeinam shiqiniti" na língua hebraica).


"Isso estende o tempo em que essas línguas [semíticas ocidentais] são documentadas”, avalia o professor. “Os linguistas agora podem examinar as mudanças que essas línguas sofreram ao longo dos séculos".